
A inteligência artificial (IA) está transformando radicalmente o mercado de trabalho, a comunicação e as nossas interações cotidianas. As megatechs e novas empresas disputam a atenção e os prompts de milhões de pessoas mundo afora. No entanto, as organizações começam a enfrentar um novo desafio. Como eu capacito minha equipe para fazer uso ético e responsável da Inteligência Artificial?
O letramento em IA não se refere apenas ensinar funcionários a usar ferramentas como ChatGPT, DeepSeek e o novíssimo Grok ,mas também refere-se ao modo como vamos interagir com a tecnologia de forma ética, segura e estratégica.
O que é IA Literacy e por que é urgente?
O letramento em IA envolve habilidades que vão além do conhecimento técnico. Pesquisadores hoje estudam mecanismos e metodologias para a difusão de um letramento que seja inclusivo e respeite as diversas formas de uso da IA. Entre as questões que estão na mesa eu destaco três pontos:
- Avaliar respostas geradas por algoritmos, identificando vieses ou “alucinações”.
- Criar e usar a IA de forma ética, evitando discriminação ou desinformação.
- Navegar criticamente em questões como privacidade de dados e impacto social.
Um estudo do Fórum Econômico Mundial aponta que a IA pode adicionar US$ 15,7 trilhões ao PIB global, mas sem um letramento adequado, os riscos de mau uso são enormes. No Brasil, pesquisas sobre o tema ainda são incipientes, enquanto países da Europa e Ásia já conseguiram avançar bastante.
Desafios que as empresas não podem ignorar
Vieses algorítmicos: Sistemas treinados com dados enviesados reproduzem discriminações. Um exemplo clássico é o reconhecimento facial que falha com tons de pele mais escuros, como mostrou a pesquisadora do MIT, Joy Boulamwini.
Alucinações: IAs generativas como o ChatGPT podem inventar dados falsos que podem parecer verdadeiros, exigindo supervisão humana qualificada.
Falta de preparo ético: Funcionários sem letramento em IA tendem a confiar cegamente nas respostas das máquinas, aumentando riscos legais e de reputação da marca.
Como as organizações podem agir? O primeiro passo é investir em treinamentos contínuos e permitir que os colaboradores conheçam as ferramentas de mercado. Comece capacitando as equipes com workshops que combinem teoria e prática, usando frameworks como o AI Literacy Toolkit (ferramenta com cartões para discussão de casos reais).
Como começar o letramento na minha organização?
Faça uma diferenciação nos treinamentos dividindo entre especialistas (ex.: desenvolvedores) e não especialistas (ex.: equipes de RH ou marketing). Outro ponto importante é adotar políticas de uso transparentes. Crie diretrizes claras para o uso de IA, alinhadas à legislação (como o Marco Regulatório brasileiro da IA, em tramitação). Inclua princípios de diversidade na governança de dados para reduzir vieses e promova uma cultura crítica. Utilize exemplos práticos para mostrar como identificar e corrigir falhas em respostas das IAs e colabore com universidades e iniciativas públicas que estão discutindo a temática como o programa de pós-graduação em Inovação Tecnológica PPGIT-UFMG. Por último, apoie pesquisas e parcerias para desenvolver metodologias de letramento adaptadas ao contexto brasileiro como a IA Maritaca AI e Amazonia IA.
Estimule debates sobre casos reais, como o uso de IA em recrutamento ou análise de dados financeiros.
O futuro é dos letrados em IA
Empresas que priorizarem o letramento em IA não apenas mitigarão riscos, mas ganharão uma bela vantagem competitiva. Funcionários mais críticos e éticos serão capazes de potencializar a criatividade usando IA como aliada, tomar decisões mais seguras, evitando dependência excessiva de sistemas automatizados.
Ethan Mollick em seu livro: Co-Intelligence: Living and Working with AI, apresenta um trabalho realizado por quatro equipes de pesquisa diferentes que tentaram quantificar exatamente quantas sobreposições existem entre os trabalhos que os humanos podem realizar e os trabalhos que a IA pode fazer. Os pesquisadores chegaram a 1.016 profissões diferentes e os estudos concluíram a mesma coisa: quase todos os nossos trabalhos se sobreporão aos recursos da IA. Portanto, estamos começando a entrar em uma nova era do trabalho e emprego, e as organizações não podem ignorar esse fato.
Alysson Lisboa é Pesquisa PPGIT/UFMG em Letramento em IA e ministra cursos, palestras e workshops sobre o tema. Email de contato: alyssonlneves@gmail.com